segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Meu Eu Retorcido - por Taisa Pinheiro

Havia no canto da boca um laivo de despedida embebido de saliva e ausência. Gesticulando deixava transparecer na língua a queda úmida de palavras densas e não ditas que aos poucos desbotavam , deixando um gosto ocre e um torpor amarelecido por entre os dentes.
Uma distância imensa: céu da boca.
Nódoas tingidas de lágrimas desciam surdamente engolidas em traquéias e a meios tons de angústia.
-Uma distância imensa – repetia.
Trouxe as mãos ao pescoço como se pudesse exteriorizar seu sufocamento. As pulsações- dedos e átrios – era lenta e o ar ainda entrava facilmente , as unhas ficavam um pouco roxas naquela compressão , pouco doía .
- “Finge tão completamente que chega a fingir que é dor , a dor que deveras sente”- pensava em devaneio ensimesmado .
As linhas das mãos , que respiravam sobre a epiderme , escorriam irregulares dentre as falanges e os mananciais da palma , perpassavam veias , que lhes eram mais profundas , formando destinos inevitáveis , ramificados sob o leito de pequenos estuários , sangue e só .
Meneava a cabeça em esquecimento, tinha seus pensamentos abrandados pela inconsciência.
- Nem quiromancia intercede pelos destinos avessos.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Escravos do Neoliberalismo

Por várias vezes fui questionado da minha escolha em abandonar a faculdade de engenharia automobilística - eu disse a faculdade, não a paixão por automóveis, nem mesmo despresando a engenharia - e mergulhar de cabeça no curso superior de jornalismo, já que esta profissão não tem mais a obrigatoriedade de um diploma. Minhas respostas nunca fugiram do óbvio: "paixão", "ideal de vida", "necessidade de viver em um mundo mais culto" e "escrever engrandece e me dá prazer".

O real motivo sempre foi próximo à minha realidade e gosto pela leitura e a arte de escrever. Talvez existam equívocos da parte dos que me fizeram esse tipo de pergunta, em sua maioria.

Todo curso superior tem um propósito muito mais nobre que definir a profissão, é algo que aperfeiçoa as qualidades únicas de cada indivíduo, que direciona a vocação ao campo vizinho à perfeição e profissionalismo. Pra qualquer alienado ou irresponsável, não é mais que o lugar onde se recebe o diploma para trabalhar em algo que os permita comprar suas bugigangas. Não só a faculdade de jornalismo, é onde os verdadeiros diamentes são lapidados.

Para ser um jornalista não é necessário ter frequentado a univerdidade, nada ensima mais que trabalhar em uma redação, mas várias portas abertas surgem no meio universitário e a amplidão de pensamentos vem como algo natural, graças ao que estudamos.

Caros leitores, amigos e desconhecidos, viver em plena felicidade, realizando sonhos e tentando ser cada dia melhor e mais sábio, reconhecendo também a pequenez de nossos conhecimentos e, com isso, a grandeza de nossas almas e voraz capacidade de bater de nossos corações está intimamente ligado a valorizar quem sabe o que quer ou, pelo menos, o que não quer. Não quero ser um escravo do neoliberalismo que vive com as mãos atadas às costas, melhor ser flagelo do mundo e ter aval o Divino de ser quem eu sou.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Sobre "A Festa da Menina Morta"

Dirigido por Matheus Nachtergaele, lançado em 2008, o longa de 115 minutos chama a atenção principalmente pela relação com o tempo. Tudo passa muito devagar, grande parte das cenas é uma demonstração do marasmo em que vive a população ribeirinha.

De grande polêmica, o filme provoca sensações diversas nos espectadores. Até mesmo em Cannes, onde foi exibido na mostra Un Certain Regarde, alguns presentes deixaram a sala de exibições durante a sessão. Se nesta não foi premiado, o mesmo não aconteceu em Havana, Los Angeles, Chicago, Gramado e Rio de Janeiro.

A história se desenrola numa cidade onde, há duas décadas, é celebrada uma festa onde todos buscam ter a benção de um jovem santo, interpretado por Daniel de Oliveira, o Santinho, que, após o suicídio da mãe, recebeu da boca de um cachorro os trapos do vestido da menina que desapareceu e fala, em transe, todo ano, incorporando esta.

Várias sequências de sexo entre o Santinho e o pai, Jackson Antunes, aparecem durante o longa, não sendo essas os únicos momentos fortes.

Conta ainda com Dira Paes, Cássia Kiss e atores pertencentes à comunidade ribeirinha onde o filme foi gravado.

O roteiro, além de Nachtergaele, conta com a criação de Hilton Lacerda, um outro pernambucano e que ajudou Cláudio Assis em outros dois filmes bem polêmicos, "Amarelo Manga" e "Baixio das Bestas", que procuram confrontar padrões.

É uma contraposição do sagrado e do profano, e centra-se no poder do misticismo. Não aspira ser um filme leve e simples, muito menos digestivo e a ferocidade dos excessos do diretor vêm retratar um Brasil arcaico, primitivo e feroz. Isso traz a imipressão que, deste filme, nasce um novo diretor, sério, engajado e comprometido com o cinema.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Sobre o "Resgate dos Novos Baianos"


O irreverente cantor Luiz Galvão, em tom de alegria e anarquismo, comenta, no documentário "Filhos de João - Admirável Mundo Novo Baiano", que "faz 17 anos que não fuma maconha nem bebe vinho." E ainda acrescenta: "O que é bom, porque eu poderia ter me transformado num terrorista." Esse longa foi o primeiro filme exibido no 42º Festival de Brasília, na última semana do mês anterior.

Com a proposta de resgatar a tragetória do grupo que sacudiu e estremeceu o Brasil todo, os envolvidos nessa história fizeram rememorações que foram gravadas por Henrique Dantas e equipe. Foi uma fase de dez anos - 1969 a 1979 - marcada pelo swing dos Novos Baianos que, ainda hoje, tem expressão e é referência para uma restrita, mas não inativa, classe de jovens. Uma figura primordial durante essa época foi o baiano bossanovista João Gilberto, grande responsável pela ascensão da banda. Dantas acrescenta que "aquilo que é testemunhado hoje, amanhã pode ser narrado de forma completamente diferente". A tese que ligava os Novos Baianos ao mundo foi a crença em eles serem "filhos" de João Gilberto.

O orçamento do filme foi restrito - cerca de R$21 mil. Os trabalhos da produção ocorreram nos últimos 11 anos e registra depoimentos memoráveis de quase todos os integrantes do grupo e ainda falas de Tom Zé a respeito dos conterrâneos, fora imagens de arquivo raríssimas e cenas basilares do cinema baiano como "Superoutro" de Edgard Navarro, 1989 e "Meteorango Kid" sob o comando de André Luiz Oliveira, de 20 anos antes.

Os "Filhos de João" tem dois fantasmas que os ronda. O primeiro e nada surpreendente foi a ausência do recluso "pai" que aparece apenas em uma única foto e nos depoimentos. O outro é Baby Consuelo, atual Baby do Brasil, que aparece em arquivo durante o filme todo mas não aparece dando seu depoimento. Foram gravadas cerca de três horas de conversa com a cantora, disse Dantas, "Foi maravilhoso. No fim eu queria casar com ela", arrematou. Após toda a edição do longa, a autorização de Baby para utilização da entrevista não foi conseguida e o filme só pode ser apresentado sem sua participação, necessitando de total reconstrução.

O longa é uma dica tanto para cinéfilos quanto para apaixonados por música e torna mais gratificante a sua apreciação quando de maneira acrítica.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

A treva

Não aguento mais ter que reverenciar artistas imbecis. E o mundo está cheio deles. Nem só artistas, também muitos imbecis. Por onde passar haverá pessoas cantarolando - que nada, estão é proclamando hinos de uma geração emburrecida e sem ideal - músicas que dizem tudo sobre como ser uma mulher sem princípios, como o corpo de tal pessoa gera apenas, apenas mesmo, pensamentos e impulsos voluptuosos, rocks de baixíssima qualidade com uma sentimentalidade sem parâmetros e que incitam revolta - não é revolução. Também, em grande parte dos papéis midiáticos que vemos por aí, somos obrigados a engolir textos extremamente mal-feitos, grande parte das vezes sem lógica ou portadores de uma alinearidade que só caberia numa escrita surreal.

Estamos asfixiados num país que tão amplo. Parece que, atualmente, tentam fazer conosco o que Mao fez na Revolução Cultural: reeducar ou acabar com os artistas e intelectuais sob a acusação de que se diferenciavam do resto da população.

A arte provocou, nos últimos cem anos, um desconforto comparável a uma noite de sono num colchão de sabugos e palha.

A defesa da "naturalidade" do gosto e das idéias está em pauta há algumas décadas: só se deve gostar daquilo que já se gosta e entender daquilo que já se entende. Atualmente isso é vendido pela "democracia" da internet e do mercado, onde tudo está ao seu alcance.

O velho, mas não desatualizado, princípio da oferta e da procura, um princípio neo-liberalista, guia também a indústria cultural. - Dá-se ao público o que ele quer, já conhece e aquilo que o fará despender menos energia ao consumir.

Com absoluta certeza, muitos artistas, os verdadeiros artistas, deixaram de se apresentar em palcos ou escrever, compor ou o que quer que fizessem já que a mídia começou a impor o que a sociedade iria consumir e a desmotivação tomou conta de um ser iluminado.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009





Pin-ups, a época de ouro da sensualidade. Meu novo wallpaper.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Nem a Mini Nem a Saia

Observando o caso da estudante de direito Geyse, acadêmica da UNIBAN, agredida e desmoralizada por mais de 600 alunos dessa universidade, colegas ou não, uso a mente para regressar ao meu tempo de colégio, nas séries mais avançadas do ensino fundamental e as demais do ensino médio. As garotas tinham seu estilo, um estilo bem solto e liberal, nem por isso eram vulgares. Volto também ao tempo que não vivi, tempo dos meus pueris genitores e enérgicos avós. As minissaias eram moda, modernas e à frente do seu tempo. E não eram minissaias discretas e comportadas, nada de 5 dedos acima dos joelhos.

Foi nessa época, em que a maioria era contrária ao regime ditatorial, que a minissaia tinha seu diferencial. E a ditadura era só do governamental. Muito do que hoje é moralizado, naquela época, era sinônimo de ser descolado, liberal. As mulheres tinham seu espaço e eram tão importantes numa revolução quanto os homens. As maiores armas da frente de batalha eram pernas desnudas, coques e cortes Channel, sapatos de verniz e uma suprema e delicada valentia.

Não que o mundo fosse regido à base de impunidade, muitas pessoas pagaram por seus atos "perturbadores da ordem". Tanto homens quanto mulheres. Prisão. Tortura. Exílio.

Talvez nossas garotas tenham perdido ou dominado parte do seu instinto contra a sublevação mas jamais perderão sua tendência e seu prazer em seduzir e encantar os homens, muito menos perderão o amor às minissaias.

domingo, 15 de novembro de 2009

Mais um verão pela metade, só tenho lamentos. Hoje temos diferentes as pessoas que no começo do semestre eram massa. Todo dia chega o proletariado, futuros vendedores, caminhoneiros, domésticas, porteiros, guardadores de carro. Os docentes só podem esperar o pior do que ocorre ou alienarem-se à realidade. Será que esse é o progresso socio-educacional de que tanto vem se falando?

Até onde iremos nesse progresso neoliberal que só denigre a imagem e a capacidade pessoal, que só desmerece e desvaloriza o trabalho digno e bem feito?

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Um ballet esquisito

Por que não ouvir clarim e esperar um bom futuro? Talvez minha voz não possa cantar todos os hinos que meu peito brada.

Já nem lembro da chegada nem espero a partida ansioso. O mundo pede bis e não entendem o pós-modernismo safado que proclamo como um revolucionário. Meus males e os bens do mundo despontam sobre o cristo.

De tanto amar acho que ela é bonita, não gosto de agitos e evito uma pedida menos brava. Toda pintura me faz rodopiar, creio no céu azul e nas águas claras.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Fer-vor

Meu caro amigo, sem perdão,
és um símbolo dum país sem nação,
desinteresse meu não tem rumo,
e não é choro teu sumo
nem amor tua dor;
ontem foste mais que mais um,
amanhã nenhum desamor.


E o que me parecia perfeito
caiu desse jeito sem perdão,
e tinha cá pra mim que eu era da pesada;
mesmo que toda a miséria me fizesse menor
ainda seria bom;
e as águas, que tantos segredos sabem,
te diriam mais do que sabemos.

Larga o dia, e passa com seu vestido grená,
um dia chove, outro dia bate sol,
e a gente vai clamando por aí,
venho atiçar suas saudades,
sem a cachaça e a aqui vão jogando futebol.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Lenha.

Hoje acordei com uma chuva pesada batendo na janela. Era menos de 5 da manhã e a vontade de sair da cama não vinha. Nem um Amor de Perdição ou uma Moreninha me tirariam debaixo das cobertas com o frio que fazia.

Me lembrei de quando, ainda pequeno, ficava na fazenda da minha bisavó sentado ao lado do fogão de lenha brincando com as brasas. Surgiam ideias para novas traquinagens, a bisa aparecia com doce de leite pra mim ou um pedação de rocambole. Não havia frio que me espantasse, e nenhum monstro surgiria para me assustar, ali estava protegido.

O fogo causa espanto, causa medo, é perigoso, mas traz também segurança, conforto, tranquilidade para aqueles que o respeitam.

Lembro também dos gatos da fazenda, aqueles gatos que ninguém os vê em momento algum, só quando alguma coisa do lado de fora da casa está errada, uma chuva forte, um cachorro ameaçador ou qualquer intempérie que signifique perigo aos ariscos felinos domésticos - nem não domésticos ou domesticados assim - que se aqueciam próximos ao fogão e ali tinham seu cantinho para dormir.

Bom mesmo era pensar que o mundo girava ao redor daquele fogão, onde toda a família se servia do que quer que houvesse em cima dele. Eram tantos primos, tios, parentes distantes e amigos que nunca a mesa da cozinha se esvaziava e a movimentação cessava.

Em cima de um armário, várias latas enormes cheias de bolachas de amoníaco e biscoistos de polvinho, e nele inúmeros potes com os mais variados tipos de pimenta. Tudo isso era acompanhamento para o que saía do fogão.

Gostaria de ouvir as histórias que esse fogão tem pra contar.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Da Escolha da Profissão

Um belo dia amanheci e, neste dia, rumei à um mundo diferente daquele que eu conhecia. Um velho conhecido que estava bem mudado, apresentava-se diferente, vestia roupas novas que ainda assim deixavam seu peito descoberto. Seu sorriso era o mesmo e seus olhos tinham agora um brilho que prendia a atenção do novo morador, transeunte conhecido da região.


Escrever, para nós, é uma necessidade. Mesmo todos os leitores do mundo e mil anos nos seriam poucos para tanto ímpeto. Viver é fundamental.

A intuição deve ser seguida quando falamos da escolha da profissão. Ela não está só ligada ao status social, necessidades e achismos, está intimamente ligada com a vocação. É nos níveis mais profundos da consciência que existem respostas para todas as indagações - aí entra a capacidade de intuir.

A compreensão sem interferências dos aspectos da realidade é chamada intuição, e vem do contato da consciência externa do indivíduo e do seu mundo pessoal e abstrato. Surge sem que se faça uso de qualquer atividade mental ligada ao raciocínio, no intervalo entre os pensamentos. Existe aí a necessidade individual de entregar as ideias com desapego à sua natural capacidade interior de resolver problemas, isso liga a percepção clara e imediata à fé, essencialmente.

Caminha-se numa linha tênue, sutil e delicada. Nenhuma excitação aflora, nem surgem paradoxos, a alegria e a tristeza, o entusiasmo e a angústia. Em geral não lhe é dada a devida importância, todavia pode-se concluir que a intuição poderia prevalecer sobre o pensamento automatizado em grande parte dos casos. É aí que muitos vestibulandos caem em tentação e optam por um curso que foge à natureza de seus corpos, deixando de lado seu íntimo selvagem, que conhece tudo o que se passa dentro de cada um deles, e agindo de forma racional, criando expectativas e sobrepondo preferências de uma massa social genérica à sua percepção nata.

A falta de instrução dos jovens com relação à escolha da carreira aliada à um mundo onde algumas poucas profissões são insignes e as outras sem relevo, quando não gera o abandono da carreira durante ou após a faculdade, promove uma enxurrada de profissionais deprimidos, inseguros e que vivem em um cárcere de emoções.

Por que não deixar o pensamento correr solto e ir atrás de seus sonhos tão logo eles sejam palpáveis?

Na vida encontramos muitas coisas notáveis e úteis, que não duvido serem proveitosas a quem procure a verdade e queira fugir de pontos obscuros, rudes e imperfeitos, os quais por vezes ocorrem.

Muitas das coisas que tememos não carregam em si nada de bom nem de mau senão enquanto o ânimo se deixa abalar por elas. À primeira vista parece insensato querer deixar uma coisa certa por uma então incerta. De fato, via as comodidades que são geradas por honra e por riquezas, a suprema felicidade não consiste nessas coisas. No que tange à concupiscência, o jovem repousa num bem criado por ela, onde torna-se impossibilitado de pensar noutra coisa.

A intuição é sábia e na vida o único Mal é a ignorância. É daquela que devemos usufruir e é nela que encontraremos a razão. Com efeito, disso podemos tirar não pequeno proveito; acresce que desse modo oferecerão ouvidos prontos para a verdade.

"A coisa mais difícil para o homem é o conhecimento próprio."

Provérbio Árabe

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Naquele Tempo - por Waldir de Luna Carneiro

Neste aniversário de "Gente Muito Importante", com parabéns para a Dalzira e sua brava equipe, nos lembramos do curso primário, quando inventamos de fundar, ao contrário de muitos que queriam um jornalzinho, uma pequena revista. Não havia a tecnologia de hoje, que edita um livro em poucos dias e uma revista em poucas horas. Depois das reuniões na sala de aula, optamos por visitar uma gráfica. O proprietário se assustou com o bando de meninos e meninas que queriam percorrer as oficinas para saber como se fazem jornais e revistas.

Não tínhamos a menor idéia de uma tipografia. Nosso espanto divertiu os tipógrafos que nos encheram de explicações. Jornais e revistas, disseram eles, saiam inicialmente de caixas de madeira divididas em compartimentos e dentro de cada compartimento, uma letra diferente. E dali as letras pulavam para uma pecinha metálica que chamavam de componedor, que era empunhado pelo gráfico com a mão esquerda, enquanto a direita ia pescando as letrinhas que nos pareciam de chumbo. Letra por letra, surgindo frases que enchiam o componedor. E não era só letra. Haviam espaços também de chumbo, de vários tamanhos e espessuras, para separar as frases; sinais gráficos de "ponto", "vírgula", "ponto e vírgula", "dois pontos", "interrogação" e "exclamação" e tudo mais que requer a grafia. As letras maiúsculas tinham seu recanto, não se misturavam com as demais. Enchido o componedor que abrigava de cinco a dez linhas, o tipógrafo, com muita técnica e carinho, transportava o composto a um pequeno tabuleiro e de lá para a paginação, um grande quadro, espécie de moldura que seria a página do jornal ou da revista. Devidamente ajustada, a composição ia com segurança à impressora, que poderia ser movida a eletricidade ou manualmente. Na impressão das páginas havia rolos, que antes de receber tinta pareciam geléias de mocotó. Saímos maravilhados. Encantados. Que notável era a feitura de um jornal. Lembrávamos de "EU SEI TUDO", a mais importante revista que naquele tempo circulava no Brasil. O dono da gráfica explicou-nos ainda que Machado de Assis muito aprendera trabalhando numa tipografia! Aquilo nos deixou enlevados e passamos a cuidar do que publicaríamos numa primeira edição. Cuidamos de juntar dinheiro, a gráfica não faria nada de graça, mas nossa emoção era tal que deixamos isso a cargo da professora, a mais interessada no nosso arrojado projeto. Ela queria saber de que assunto cuidaríamos. Choveram composições: "A Fazenda assombrada", "O pio da codorna", "A lagartixa esperta", e como era tempo da Revolução Constitucionalista, surgiu "Morte no túnel da Mantiqueira". E o título para a revista? "A Voz do estudante"?, "O Dever"?, "O Brado Juvenil?, "O Colibri"? Saiu até, me lembro bem, "Juventude Importante". Foi a batalha mais árdua. Não sabíamos como arrumar um bom título. Dezenas de opiniões surgiam, pedimos ajuda para os colegas de outras séries, parentes e amigos, até que o marido da professora, conhecido pela sua sovinice, não querendo participar com dinheiro, nos convenceu que deixássemos de bobagens, seria uma revistazinha que ninguém ia ler. E lá se foi o nosso sonho, o decantado projeto, mas aprendemos, descobrimos como se faziam jornais e revistas. Aquela tipografia nos pareceu tão importante que passamos a olha os tipógrafos como se fossem engenheiros, os arquitetos, os construtores das catedrais do saber.




Na primeira vez que li esse texto do querido "tio Waldir", o maior dramaturgo amador do Brasil, contista premiado, dedicado às comédias de costumes, também recebedor da "Medalha da Inconfidência", do Estado de Minas Gerais, como reconhecimento do seu trabalho, várias sensações, por mais estranhas que me parecessem, afloraram. Numa segunda leitura, me veio à cabeça um mundo mais charmoso, mais lido, menos robotizado, menos desinformado, menos globalizado, no qual eu gostaria de ter vivido. Nas leituras subsequentes, tudo tornou à minha infância, quando queria ser alguém diferente.

Eu era movido à música boa, clássica, tinha, e ainda tenho, Bach como meu preferido, ao lado de Vivaldi e Richard Strauss. Aluava ao som de marchinhas, bossa nova e sambinhas aos oito. Aos dez, queria ser diplomata. Uma compreensão de mundo muito menos ligada ao que pensavam os outros e muito mais livre de preconceitos.

Não desbota da minha memória a expressão da face dum colega de sala da terceira série num dia que acordara com a pá virada. Em resumo, me senti um serzinho verde ou cinza, com o que ele me dissera, vindo de outra galáxia. Meus canais com esse mundo que eu cultivava se fecharam parcialmente. Tornou-se um prazer quase secreto escutar músicas que nenhum outro garoto da minha idade escutava. Imaginava-me como um pecador por não gostar do balanço do axé ou a batida da música cowntry.

Quem dera eu tivesse conversado com meus pais, pessoas instruídas, sobre o que aconteceu. Talvez minha infância não teria a marca desse dia. Poderia ser bem diferente. Será que eu não teria influenciado o gosto musical e o prazer da leitura em alguém? Provavelmente eu gostasse mais de ler e escrever do que gosto hoje. E redigiria melhor, e teria mais bagagem cultural e minha leitura seria tão dinâmica como será daqui certo tempo.

Bom mesmo é pensar que ainda penso, e é melhor do que nada.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Alimentação e hábitos de vida saudável.

Se nos alimentássemos melhor, viveríamos mais. Fato consumado, rematado.

Se nos alimentássemos da música que nos é imposta pela mídia já teríamos morrido há muito tempo. Onde estão os ícones culturais, os homem-luz nos quais nos espelhamos?

Talvez um regime opressor gerasse emoções, frustrações, insatisfações, sentimentos que traduzir-se-iam em elementos culturais de qualidade, proporcionando um engrandecimento espiritual no "pai-da-obra" e insuflando pensamentos e sentimentos nos consumidores.

Talvez o caminho do meu sangue nao estivesse alterado pelos ateromas de sertanejo, das danças "da bundinha", "da boquinha da garrafa" e das frases sem pudor do Funk. E aquele bate-estaca que altera meu ritmo cardíaco talvez fosse uma influência pouco conhecida no meu mundo e no seu também. Se você perde seu tempo lendo textos de um jovem que ao menos tenta ter senso crítico, você não é massa, é molho.

Fast-food é junk-food. Fast-food é música de hoje em dia. Junk-food, junk-music.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

O Direito À Vida na UE

Nos jardins de Belém existe um painel de azulejos alusivo à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, promovido, entre o outras entidades, pelo Centro de Informação Jacques Delors e pela Junta de Freguesia de Sta. Maria de Belém.

O painel até é original e a mensagem importante. A curiosidade está na interpretação que se faz do artigo 2.º daquela Carta segundo o qual “Todas as pessoas têm direito à vida. Ninguém pode ser condenado à morte, nem executado.”



A "criança" que ilustrou este fê-lo de forma original o que me leva a dizer "abençoados pais que geram crianças tão esclarecidas"

domingo, 26 de julho de 2009

Chicória-maria e um bando de bolinhos de carne.

Pensando sobre o que faz me bem e o que me faz mal, vi minha saúde indo e vindo, pra lá e pra cá, como um pássaro ao fim de tarde. Por que precisamos nos preocupar tanto com o bem-estar e o bom funcionamento do nosso corpo? Não seria mais fácil vivermos sempre com um pouquinho a mais, sem nos preocupar com a balança, colesterol, triglicerídios, pressão sanguínea, ateromas e afins? A escravidão do dia-a-dia-frenético-sedentário é o Lenin dos dias de hoje e a balança é Stalin botando em prática o primeiro.



Tempos atrás, quando não existia wafer, chips, hamburger e fast-food, se vivia em paz consigo mesmo.



Tempos adiante, quando quando alface for obejto de museu, arroz integral for apenas tema de tese de doutorado, grama for artigo sintético destinado a animais herbívoros, os ninhos dos pássaros forem feitos em árvores plásticas e não se saber o que é chicória, almeirão, pequi e tantos outros, perguntarão a um homem remanescente de outros tempos, morador de uma casota, que comeu cenoura sem ser coelho e não conheceu banana-nanica na literatura, como era a vida sem sobrepeso, infarto aos 40, boa circulação e sem problemas de pulmão.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Pra viver um grande amor.

"A loucura é um simples desarranjo, uma simples contradição no interior da razão, que continua presente"

Para muitos, o mundo é algo incompreensível. Outros tantos tem olhos voltados a um mundo inteligível.

No curso de engenharia automobilística da FEI, onde estudei até ano passado, vivía num mundo racional, palpável e lógico. Hoje, tenho novos lápis em minhas mãos, aqueles que podem, num piscar de olhos, tornar em pincéis ou fotografias. Decidi mudar o rumo, talvez essa seja minha sina, decidi escrever. A faculdade de jornalismo será meu novo mundo.

O gosto pela leitura, pelas artes, pela música e a arte prática da escrita compraram por preço simbólico meus ideais. Quem sabe já não eram os donos dessa filosofia meus sonhos?

Até me estranho nesse momento, escrevendo em primeira pessoa, dizendo a alguns sobre algo que não os interessa e sonhando com as tardes no alto das Mangabeiras acompanhado por um livro, empoeirado e nem por isso menos fantástico.

sábado, 11 de abril de 2009

O Criar da Arte pela Arte

Hoje me veio a vontade de fazer algo genial. A genialidade fica num mundo diferente deste que estamos, fica à deriva num mar de cópias bem feitas, bem aproveitadas. Do cais se escuta os gritos dos passageiros que veem o navio partir sem levá-los, aí estão as más idéias, que açoitam a mente doentia dos submetidos ao beneplácito régio. Poemas em prosa num país de cegos-surdos-mudos e pirâmides sem sol. Exaurido da criação, gerou mais um.

terça-feira, 17 de março de 2009

Pro mundo em chamas, Deus fez a chuva. Pro mundo de cabeça pra baixo, tenho um espelho. Pro mundo desconcertado, a ressurreição. Pro mundo sem razão, o mundo na tua ausência.
Que caiam dum lado as chaves da prisão, do outro as roupas, pelas minhas costas cem mil e jamais serei tocado. A ti, minha frente, sou um trapo.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

A natureza é aquele lugar da paz, do som da chuva e do canto dos pássaros, minha casa e refúgio dos meus medos. Nesse lugarzinho tão grande, do vento molhado que sussurra nos meus ouvidos, a cegueira, mãe da visão, é só fato da tua existência. Caído ao pé da figueira, o sol me contava histórias de um presente que só ele via e que só a lua sentia sem mais nada poder fazer por nós. Mesmo assim, na teimosia da formiga, a comida do futuro vai alimentando o coração e reinventando a cada dia o amor.

Por vida e por céus, súplicas e promessas, jamais faltem com a verdade.

sábado, 31 de janeiro de 2009

No Cárcere

Ansiedade virtuosa que tão pouco diz, clamo a ti por tempo, relativo rápido. Debaixo dum véu, onde te encontro? Pinheiros que deixam qualquer um sem sossego, sinuoso e longo é teu trajeto, estrada pra viver. A estática e estética que guardo em meu bolso, todo dia, de chuva ou sol, me mostra sonhos e fantasias. A polêmica e a modernidade, frontadas, tornaram-se combustível duma fogueira que, mesmo não ideal, não forma resíduos.

Ali tem uma ponte onde um morador nada ilustre, velho negro, de poucos dentes, olhos caídos e cabelos bem grossos, cria histórias. Senhor jocoso e amante do alcatrão, inebriante. Tudo o que dizes é fogo-fátuo, nos faz sentir tolos e envergonhados da própria crença um no outro. Noite sem sono daquela manhã, criada por ele, não mais venha me visitar.

Cada despedida de todo reencontro é envolvida de apego sem limite e os olhos longe estão, as almas se vão, os pensamentos sem não. Dum lado a mãe de todas as esperanças e do outro o tronco da laranjeira. Pra frutificar, em pedras, o açoite tem que vir e calejar. Pra colher, os frutos tem época, um de cada vez, quando maduros o bastante. Unir e pensar, de alma e sentimento, com a vontade de, com os frutos e muito açúcar, doce fazer e nunca mais perder.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Na Alvorada Trago Açúcar, Luto, Incansável, Amada.

Tive vontade, certa vez, ou hoje, de sentar-me na calçada, ou assentar-me. Que piso, firme, serei. Preferi escrever e contar a todos glórias e desventuras num velho caderno, capa desbotada e folhas amareladas onde meu mundo me conforta. Desesquecer da violência pátria, amargosa-cansada. Os olhos ardem, de sono, de água, de-você-que-nasceu.

sábado, 10 de janeiro de 2009

A ti, que sabes de mim

Ao contrário, sou mais sossegado e sensível do que pareço exteriormente. Antes, nem eu entendia isso, talvez as explicações mais lógicas pra uma personalidade estejam na irracionalidade das ações. Aquele paredão de pedra, cinza e frio, alto e irregular, intimidador, causou-me uma introspecção. As inseguranças afloraram e, apesar disso, o medo era o que menos se manifestava.

Se o telefone toca, com ímpeto, meu braço corre a atendê-lo.

Os verdes campos da região, suas árvores e bichos. Os sons e os cheiros. Noites e dias. O tempo e o vento. Um minuto pra pensar e um segundo pra dizer qual o motivo dos átrios e ventrículos baterem em harmonia tão descompassada. A eternidade é o céu e a terra num casamento celebrado por Deus, ligeiro e esplêndido.

Sou pós-impressionista, daquilo que meu fracasso é capaz de me dar, só quero a fama póstuma. Acordar metamorfoseado em insetos e, de larvas, ser borboleta. O burburinho da destemperança não me dá náuseas nem incomoda. Meus ânimos, sem contemporizar, elegantemente foram acalmados pela própria vida, minhas expectativas.

De todos os cheiros, aquele da chuva agitada é necessário, o das flores é reconciliação e meu perfume só a ti importa, vida. Os cérebros entorpecidos reduzem o desconhecido ao conhecido e a imaginação, que venero, parte de mim, sem pudor, não perdoa. A explicação da terra, retida em corações pelo menino bom, tarda a clarear o mundo.

Nada é imoral e subverso, a pele chove, os olhos, miúdos e reticentes, cantam a generalidade única e exclusiva da época. Um homem é um homem, não sou nenhum cientista louco, muito menos adoro pileques pra esconder meus fracassos e celebrar minhas vitórias.

Canção do Desexílio da Amazônia

Minha terra tem palmeiras
tem palmeiras de açaí.
Delas, ouro cor de massapê,
não come mais o sabiá.

Sem teu estímulo, o Brasil,
não cai nem se levanta.
Não é água nem é vinho,
nem mais estranho no ninho.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Doralinda

Ai, Doralinda. Onde e por que

quando, assim te vim, um presente divino,

me disseste de teu amor e não de como amar-te?

Ai, Doralinda! Caiu do céu o verde dos teus olhos.




Ai, Doralinda. Você, que eu, mais

velha, não me disse como cantar-te uma ode na tua ressurreição,

me faz chorar pelo dia de amanhã,

a tua embriaguez sem pecado.




Por esta vida já me basta tua necessidade,

sozinho viver num mundo líquido e áureo.

A tormenta açoita o navio, ancorado e de proa ao mar aderna

por aqui nao ter como mais desbravar os sete mares,

corações de teus filhos, Doralinda!



Ai, Doralinda! Sê-de tu e volta pros nossos braços.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

cartilha da cura




As mulheres e as crianças são as primeiras que desistem de afundar navios.



ana cristina cesar

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Tudo tem motivo, nem tudo tem propósito. Enxergar o mundo pelo lado de fora me tornou excerto de uma literatura insensata e baseada em flashes. Quanto realismo fantástico para a árvore ex-carregada de bons frutos!

-Ah, da Conceição, me diga tudo que eu posso saber, Orfeu, pra esse dia sem rumo e essa noite tão clara!

Ressoando as paredes, resiliente, o pranto cavou fundo. Me disse que onde lhe aprouver, qualquer um que o arremate. E leva, porque o mel, correndo o peito extravasado, lhe amarga a vida. Ai, que medo de me sentir mais eu.


-Hoje tudo vale meu verso e meu silêncio
-quero novas e boas, jamais más
-me conta, ai tu, e u é?

-Ai, tu, que queixas que nunca te louv(o) em meu cantar
-ora quero te perguntar, como nova poderei amar
-quem me fez tronar d'onde eu ia
-e que nunca não lhe tivera grado?

domingo, 4 de janeiro de 2009

A vida é a arte do encontro, não posso deixar de pensar no futuro. Há tanto desencontro. Meu poetinha me guia, me canta os versos de uma canção destinada, desde o primeiro inimigo, ao sucesso. Pois, meu Deus, onde, Nosso, está a realidade? E minha, senão de mais ninguém, família de uma única pessoa?

Pra nos dizer de hoje, cadê tudo o que passamos? Tudo que sempre nos fala, tudo que sempre nos ama. E aquilo que mais prezo - me dá conforto e alegria. Tudo vive e pulsa junto, isola-se no ritmo e prolonga-se na continuidade. Nos há todo um comum indivisível.

Meu sangue nos poros fundos do cardíaco ritmo por ti descompassado, me ferve de paixão e de louvor. E faz cantar meus átrios quando teu pensamento, a todo momento, me vem.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Vem sorrir, vem voar, sentir a Deus, amar. Vem ano.

Sente aqui o vento que te trás, senta. Sê flor, sê anjo, que eu te amo, vida.

Pra quem sabe, este é seu. Viver é privilégio. Divino a teu lado estar.